Dados sobre o auxílio emergencial se referem a casos em todo o País e ainda são parciais. Investigação da CGU, em parceria com outros órgãos de controle externo, está em andamento e resultado deve ser anunciado nas próximas semanas
Giovani Pacelli, superintendente da CGU (Foto: Fabio Lima)
As distorções encontradas pela Controladoria Geral da União (CGU) no País sobre o pagamento do auxílio emergencial vão muito além de casos como os 24.232 servidores públicos estaduais e municipais no Ceará, os mais de 73 mil militares brasileiros ou um grupo de criminosos locais com mandados de prisão em aberto que embolsaram o benefício.
Ao peneirar CPFs de milhões de brasileiros, cruzando bases de dados diversas com a lista do auxílio, o órgão já sabe quantos donos de lanchas e iates, empresários com firma ativa de médio e grande porte, proprietários de veículos acima de R$ 60 mil, doadores de dinheiro na última campanha eleitoral ou gente com domicílio fiscal fora do Brasil também foram contemplados com a ajuda de R$ 600 para atravessar as "dificuldades financeiras" da pandemia do coronavírus.
Contagem parcial identificou que mais de 206 mil nomes aparecem apenas nesses perfis de bens e despesas citadas. Pelos patrimônios descritos, haveria "potencial incompatibilidade" (termo usado pela CGU) para que recebessem o benefício. São registros de quem teve no mínimo uma ou duas parcelas do dinheiro liberado - sacado ou transferido para contas bancárias.
Entre as inconsistências descobertas no auxílio emergencial estão:
- 74.682 CPFs que receberam auxílio emergencial possuem empresa atualmente aberta, com mais de cinco empregados registrados no ano de 2018, conforme a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) 2018 - que mostra ao governo dados fornecidos por empregadores e pessoas jurídicas;
- 86.632 CPFs que possuem veículos de valor superior a R$ 60 mil;
- 21.856 CPFs que possuem embarcações de alto valor;
- 85 CPFs que realizaram doação superior a R$ 10 mil nas eleições de 2018;
- 22.942 CPFs que possuem domicílio fiscal fora do Brasil.
"Pessoas que doaram R$ 10 mil ou mais e agora buscam retirar parcelas de R$ 600? Não faz sentido", ressalta o superintendente da CGU no Ceará Giovanni Pacelli. Apesar disso, ele destaca que os casos ainda estão sob análise. "Não quer dizer que está irregular. Pode ser que gente dessa lista possa fazer jus. Essa investigação está sendo feita pelo órgão central em Brasília", explica.
Ao ser questionado se já foram identificados desse casos de patrimônios elevados no Ceará contemplados com o auxílio, Pacelli reconheceu a possibilidade. Preferiu, porém, repetir que a condução do trabalho é via Distrito Federal. O POVO apurou que há investigação local em andamento sobre cearenses empresários e residentes no Exterior com emprego fixo que receberam o benefício.
Em nota, a Controladoria Geral admite que as checagens feitas "não conseguem especificar se as pessoas portadoras desses CPFs cometeram fraude ou se tiveram suas informações pessoais usadas de forma indevida". O cruzamento apenas visualiza que o CPF consta como requerente ou atendido.
A investigação segue sendo feita e tem parceria da CGU com tribunais de contas da União e dos Estados, Receita Federal e órgãos do Ministério Público Federal e dos Estados. O resultado deve ser anunciado nas próximas semanas, acompanhando o pagamento das três parcelas.
"A Controladoria consolidou a lista desses CPFs e encaminhou como informação de inteligência para as autoridades policiais e ministérios públicos nos estados para checagem dos dados e ações de competência daqueles órgãos", informa a CGU. No caso, a responsabilização administrativa (se envolver servidor público) ou penal de cada caso. Entre os crimes previstos estão falsidade ideológica, estelionato ou apropriação indébita (se não houver a restituição do dinheiro). A intenção do governo é reaver parte dos valores do auxílio por devolução, voluntária ou cobrada.
Outra frente dessa investigação que estaria bem adiantada trata dos servidores federais que também receberam indevidamente o benefício. Uma lista que também bate no mapa cearense - fato já constatado, segundo o chefe local da CGU. O POVO mostrou que, no caso dos servidores estaduais beneficiados, aparecem coronéis e sargentos da Polícia Militar, secretários municipais, chefes de gabinete, advogados, procuradores municipais, diretores de finanças, chefes de setor e até inspetores da Polícia Civil lotados no Tribunal de Justiça. Esses serão obrigados a devolver o benefício, se não comprovarem de fato o direito de receber.
A lei 13.982, de 2 de abril deste ano, de criação do auxílio emergencial, é impeditiva para quem tem emprego formal ativo ou com renda mensal familiar entre três salários mínimos (R$ 3.135) ou renda individual por mês de meio salário mínimo (R$ 522,50). A verba é destinada a trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados no período de enfrentamento à crise causada pela pandemia.
Auxílio emergencial: como devolver, em caso de irregularidade
Quem recebeu o benefício indevidamente podem fazer a devolução dos valores pelo canal virtual do Ministério da Cidadania: https://devolucaoauxilioemergencial.cidadania.gov.br/devolucao
Auxílio emergencial: como denunciar uso do CPF por terceiros
Se um servidor suspeitar que seu CPF e outros dados pessoais tenham sido utilizados por terceiros para obter o auxílio emergencial, uma denúncia deverá ser feita através da Plataforma Integrada de Ouvidoria e Acesso à Informação - Fala.BR, no endereço eletrônico https://sistema.ouvidorias.gov.br/
Fonte: O Povo
Nenhum comentário:
Postar um comentário