Em entrevista à Sputnik Brasil, Manuela d'Ávila ressaltou que acredita ter agido corretamente em ter passado o contato do jornalista para o hacker de Araraquara e contou com tranquilidade diante da situação. "Eu não tenho defesa, porque não sou investigada. E não tenho envolvimento, porque não sou parte. São dois termos que talvez os meus adversários usem porque querem tirar do foco o tema central".A entrevista foi concedida após a ex-deputada do PCdoB participar de um debate sobre o cenário do Brasil e fez sessão de autógrafos de seu livro, "Revolução Laura", na tarde deste sábado (10), em Lisboa, Portugal.
"O tema central é que eu recebi denúncias de envolvimento de autoridades do estado brasileiro em crimes muito graves. Parece evidente que nenhuma pessoa no mundo que recebe denúncias de crimes cometidos por autoridades do estado denuncia a essas mesmas autoridades os crimes cometidos por elas. Então fiz aquilo que acho que qualquer cidadão de bom senso faria. Recomendei que, mesmo eu sendo jornalista, essa pessoa (o hacker) deveria procurar o melhor jornalista do mundo. Acho que fiz o certo", afirmou Manuela, concluindo: "Acho que fiz o certo!"
Em depoimento no dia 23 de julho, Walter Delgatti Netto, preso como suspeito de ter hackeado os celulares das autoridades envolvidas na operação Lava Jato, afirmou que foi Manuela d'Ávila quem intermediou o contato com o jornalista Glenn Greenwald. A ex-deputada publicou uma nota em seguida, na qual confirmou ter sido contactada por uma pessoa anônima no Dia das Mães, 12 de maio, logo após receber um alerta no celular de que seu aplicativo Telegram teria sido invadido.
No Brasil, os advogados de Manuela d'Ávila já afirmaram que, tão logo retorne ao país e seja chamada pela justiça, a ex-deputada prestará depoimento. "A minha consciência está tranquila. Eu deito de noite e, quero dizer pra vocês, durmo rapidinho. Não sei como é a situação deles", disse Manuela d'Ávila durante o debate em Lisboa.
Diante de uma plateia lotada, Manuela d'Ávila falou por duas hora e meia. Logo no início, fez piada com as críticas de que teria "sumido". "Acho que nunca fiquei tanto tempo sem falar em toda minha vida e nem estou escondida, vocês estão me vendo". A ex-deputada disse que aproveitou o período fora do país, que começou no dia 23 de junho na Escócia, para estudar inglês, terminar um livro e também refletir "com um certo distanciamento" sobre a situação atual no Brasil.
"Eu organizei isso há mais de seis meses e agora devo voltar, em três dias, para fazer o lançamento do meu livro. Está nos detalhes finais. É um livro sobre feminismo para jovens mulheres", contou Manuela d'Ávila à Sputnik Brasil.
Críticas e cobrança
A fala de Manuela d'Ávila em Lisboa refletiu sobre a importância do papel das mulheres e das pessoas negras na resistência à "ameaça à democracia, com fortes traços de fascismo".
Para a ex-deputada, o "estado de exceção" no qual considera que o Brasil está, tem Jair Bolsonaro como o "maestro da construção da autorização da violência política".
Ainda sobre Bolsonaro, Manuela d'Ávila é categórica: "é uma das figuras mais esdrúxulas. É difícil imaginar que um outro presidente fale de cocô". A referência foi à declaração de Jair Bolsonaro nesta sexta (9), quando o presidente sugeriu "fazer cocô dia sim, dia não" para ajudar no combate à poluição ambiental.
Para Manuela d'Ávila, a eleição de Bolsonaro e o apoio atual ao governo foram construídos como "uma realidade paralela" com uso central de tecnologias.
"É como se existissem dois espaços públicos. Eles construíram um em paralelo em que colocaram 30% da população. Eles construíram monstros. É o monstro Manuela. É preciso que a gente saiba que essas pessoas acreditam em mentiras que são construídas por um sistema de mineração de dados que é global. É preciso compreender como isso é determinante na construção do fascismo brasileiro, desse pensamento da extrema direita. Eu nunca sofri violência na rua por nada real. Sempre foi ódio movimentado a partir da mentira".
A ex-deputada acredita que a oposição precisa corrigir a forma de agir. "Um erro nosso grotesco é tratar todos que acreditam (na desinformação) como nossos inimigos, como blocos. Eles nos tratam como blocos por que eles são fascistas. É a desumanização, é o inimigo comum. Essa é a estratégia do fascismo, é o método de nos desconstruir enquanto humanos e nos 'emblocarem' enquanto uma coisa comum. Não podemos reagir da mesma maneira", disse a política.
Futuro político
O chamado de Manuela d'Ávila durante o debate foi pelo diálogo. "Nosso caminho segue sendo o mais tradicional, conversar com as pessoas. A esquerda não pode se cobrar compromisso ideológico. Queremos essa liberdade de ser livre de novo, de estar em espaços que as pessoas discordam da gente. Eu não quero ser aplaudida, só quero andar com minha filha e não ser cuspida por defender que as pessoas precisam de dignidade".
A agenda política vai ser intensificada com os preparativos para o lançamento do novo livro, que será "mais um instrumento de luta política". "Os lançamentos dos meus livros sempre acontecem acompanhados de um debate sobre o momento do Brasil. O meu livro 'Revolução Laura' tem toda a renda revertida para o combate a fake news e redes de ódio. Consegui estabelecer uma dinâmica em que o foco não é o livro, é a luta política", contou Manuela d'Ávila à Sputnik Brasil.
Ainda na entrevista, a ex-deputada não descartou articulações para uma possível candidatura em 2020, ano de eleições municipais. "Quando voltar vou conversar com meu partido e com os partidos do nosso campo político sobre as próximas eleições. Vou avaliar a situação das eleições da minha cidade, vou refletir sobre isso conjuntamente".
Com informações Sputinik Brasil
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