Pesquisa Ibope-CNI ajuda a desfazer o mito de um presidente capaz de “governar com as massas” – e ajudará a corroer ainda mais apoio ao Planalto no Congresso. Veja, em detalhes, os números e seu significado.
Por Antonio Martins*
Desde que Bolsonaro chegou ao Palácio do Planalto, e ficou clara sua incapacidade colossal, um fantasma atormenta certos setores da oposição. O presidente estaria, no fundo, encenando uma peça, para “convocar o caos”, derrubar o sistema político e instalar um governo francamente fascista? A nova pesquisa de popularidade presidencial divulgada hoje pelo Ibope ajuda a desfazer esta fantasia. Governo péssimo resulta, realmente, em perda rápida de apoio. Em menos de seis meses de governo, o percentual de apoio ao presidente (os que julgam sua gestão “ótima” ou “boa”) despencou para 32% da população. Esta fatia otimista já se reduziu, agora, ao mesmo tamanho da parcela que vê Bolsonaro como “ruim” ou “péssimo”. É o pior resultado já alcançado por um presidente eleito pelo voto, a esta altura do mandato, desde a redemocratização. Após o primeiro semestre no Planalto, Lula tinha 44% de bom e ótimo (48% no segundo governo). Dilma, 48%; FHC, 42%; Itamar, 35%; e mesmo Collor de Mello, após dar calote nas poupanças da população, chegava a 34%. Abaixo de Bolsonaro hoje, só FHC em seu segundo mandato (15%, em plena crise cambial) e Dilma 2 (5%, após aplicar o estelionato eleitoral de 2015).
Sem estilo e sem confiança: Dois outros resultados da pesquisa deveriam contribuir para desfazer a crença na suposta força do ex-capitão. Cresceu expressivamente (de 40%, em março, para 48%) o percentual dos que desaprovam sua “maneira de governar” (46% a aprovam). E já são 51% (contra 45%, há três meses) os que “não confiam” em Bolsonaro (46% ainda confiam). Ou seja: não se confirma a hipótese de que a agressividade, as quebras toscas de protocolo, os xingamentos e as patetadas em geral sejam “populares”.
Quanto mais “povão”, mais oposição: Aliás, o Ibope revela: a oposição a Bolsonaro é muito maior entre os setores populares. No Nordeste, os que consideram o governo “ótimo” ou “bom” já baixou a 17%; e no Norte e Centro-Oeste, despencou de 33% para 20%. Nas capitais (que incluem vastas periferias), 37% julgam o presidente “ruim” ou “péssimo”. Entre as mulheres, 57% “não confiam” em Bolsonaro (54% dos homens ainda “confiam”). Ao contrário do que às vezes se crê, o capitão segue forte, mesmo, entre as elites: os mais brancos e os mais ricos – aliás, o público principal das manifestações em seu favor. Na região Sul, por exemplo, 52% julgam seu governo “ótimo” ou “bom”. Entre os que têm curso superior, incríveis 43% pensam que o restante de seu mandato será auspicioso…
O que mais desgasta o ex-capitão: O Ibope sondou, por fim, o apoio da população a políticas específicas do governo. Os resultados são um bom roteiro para guiar a ação política de oposição a Bolsonaro. Por exemplo: 59% desaprovam as taxas de juros (contra apenas 32% favoráveis), o que revela amplo espaço para denunciar a ganância dos bancos e dos banqueiros instalados no governo. O sistema de impostos é rejeitado por 61%, o que indica a popularidade de uma Reforma Tributária redistributiva. 56% estão descontentes com a Saúde (e, portanto, estão propícios a lutar contra o congelamento dos gastos sociais). 55% declaram-se insatisfeitos com a (inexistente) política de combate ao desemprego. Após as jornadas de maio, dos estudantes e educadores, 54% já rejeitam a política educacional. O único ponto em que Bolsonaro ainda tem apoio majoritário é, segundo a pesquisa, a Segurança Pública – um tema que a esquerda costuma abandonar, por preconceito.
Más notícias na pior hora: Os sinais de desgaste acelerado do Planalto vêm num momento particularmente delicado para Bolsonaro. Os preparativos para as eleições municipais de 2020 já começaram. No Congresso, deputados e senadores dão os primeiros sinais de que temem as urnas e hesitarão em votar projetos impopulares. O governo está perdendo tempo precioso para aprovar seus projetos mais importantes – entre eles, a Contrarreforma da Previdência. No segundo semestre, tudo será mais difícil: a oposição do eleitorado crescerá, os parlamentares cobrarão mais caro para votar contra os interesses da maioria, o Executivo terá enormes dificuldades para manter o discurso de que “não faz concessões”. Está aberto o caminho para uma oposição muito mais efetiva – que seja, inclusive, capaz de partir para as alternativas. A dúvida é: haverá esta oposição, enfim?
*Jornalista, editor do Outras Palavras. Foi fundador da edição brasileira do Le Monde Diplomatique.
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