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terça-feira, 3 de julho de 2018

Colcha de afeto

Manuela saiu vitoriosa de uma arena montada para derrotá-la. O caminho para uma sociedade que respeite as mulheres ainda é longo.

Por Jandira Feghali*

Reprodução
   
O machismo vem sendo combatido com força e denunciado em igual proporção à intolerância crescente dos que se revoltam com o combate a essa cultura historicamente preconceituosa. Os fatos das últimas semanas comprovam que é necessário que nossas vozes se ampliem. O primeiro exemplo vem da corajosa e altiva participação da pré-candidata a presidência pelo PCdoB, Manuela D’Ávila, no programa da TV Cultura – “Roda Viva”. O que assistimos foi lamentável.

Manu foi interrompida mais de 60 vezes pelos entrevistadores. Um deles, um apoiador da extrema-direita, foi enfático na tentativa de desqualificar a entrevistada a partir de um discurso que, em nada, coaduna com seu papel diante de uma pré-candidata. Na verdade, nenhum dos jornalistas convidados se preparou para ouvir as propostas de Manuela. O objetivo foi outro. Concentraram as perguntas – e as interrupções sucessivas – numa tentativa de ofender sua condição de mulher, comunista e pré-candidata à Presidência da República.

Se, por um lado, Manuela não conseguiu expor por completo suas ideias sobre a reforma tributária que o PCdoB defende, geração de renda, incentivo à cadeia produtiva nacional e nosso projeto de desenvolvimento sustentável, por outro expôs a baixeza de um comportamento que não se repetiu com outros pré-candidatos. Saiu vitoriosa de uma arena montada para derrotá-la.

Não são poucos os exemplos do quanto ainda é longo o caminho para uma sociedade que respeite as mulheres. A ex-presidenta Dilma Rousseff e a senadora Gleisi Hoffman já estamparam capas vergonhosas da revista “Isto É”. O próprio golpe de 2016, camuflado de impeachment, foi misógino.

Retiraram uma mulher do poder imputando-lhe crimes não inexistentes. Ofereceram a ela um tratamento impensável em um país onde a igualdade de gênero já deveria ser uma realidade. E os adesivos de carro em protesto contra o preço da gasolina? Vocês se lembram?

Sem falar no que ocorreu na Rússia, onde brasileiros rodearem uma torcedora russa, gritando obscenidades e fazendo com que ela, sem entender o que diziam, repetisse a expressão machista. Foi a prova de que a visão preconceituosa do homem sobre a mulher por aqui ainda é enraizada.

E o nosso digníssimo ministro do Turismo, Vinicius Lummertz, saiu em defesa dos agressores! Segundo ele, “o caso não foi tão grave, já que não morreu ninguém”. É o tipo de afirmação que desenha o Governo no Brasil. Não reconhece o machismo dos torcedores e ainda permite que ele seja praticado com veemência. Uma declaração que ajuda a fomentar a cultura de feminicídio e de violência doméstica em todos os cantos de um país onde doze mulheres são assassinadas todos os dias, segundo estatísticas de 2017 do Monitor da Violência, USP e Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Aliás, um dos entrevistadores do fatídico programa Roda Viva, também opinou sobre o episódio na Rússia. Joel Pinheiro, que se diz filósofo e economista, escreveu recentemente que “precisamos ser mais tolerantes” com os casos de machismo na Rússia. São declarações assim que incentivam a cultura que mata e violenta as mulheres. Afinal, hoje é um assédio, amanhã um tapa e depois um enforcamento. Mas, para ele, devemos ser tolerantes.

Ao escrever o texto final da Lei Maria da Penha, em 2006, vi inúmeros casos como esse por todo o país. As agressões, muitas delas psicológicas, começam de forma sutil até progredirem a crimes de todos os tipos. Matam mães, filhas. Destroçam lares, vidas, sonhos. As vítimas escutam todo tipo de desculpas para não chegar à denúncia. Mas, a segurança de uma Lei que veio para protegê-las tem sido importante instrumento a incentivar as denúncias. Nesta semana mesmo, a atriz Jennifer Oliveira, de apenas 19 anos, postou em suas redes sociais marcas de agressão por um ex-namorado. Fez de sua dor a coragem para denunciar.

É assim que devemos seguir. Denunciando, apontando, coibindo. Sem ter medo, sem receio algum. Nos envolvendo numa grande rede de solidariedade e proteção. Construindo uma cultura de paz e respeito para nossas filhas e netas. Tecendo para as novas gerações uma colcha de afeto e igualdade. Um pouco a cada dia, num imenso esforço coletivo. E façamos cumprir a lei contra aqueles que nos desrespeitam, violentam, humilham, agridem e matam. Mexeu com uma, mexeu com todas!

*Jandira Feghali é deputada federal pelo PCdoB-RJ

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