Familiares da vereadora e do motorista Anderson Gomes, que também foi morto, só conseguem obter informações sobre as investigações pela imprensa.
Quatro meses após a execução da vereadora carioca Marielle Franco (PSOL) e do motorista do partido, Anderson Gomes, a Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro mantém sigilo total. Não há divulgação de informações oficiais sobre as investigações e os delegados envolvidos no caso estão proibidos de dar entrevistas.
Segundo informações de uma fonte próxima à Marielle, o delegado Fábio Barucke - um dos que trabalham no caso - teria comentado em uma recente conversa com o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), amigo da vereadora, que a investigação do caso é “a mais complicada da história deles no Rio”, pelo fato de atingir uma parlamentar e pelo “nível profissional” do crime.
Apesar disso, o silêncio da polícia tem preocupado familiares e pessoas próximas à vereadora e seu motorista. “Ficamos tão apreensivos quanto todo mundo”, disse Anielle Silva, irmã de Marielle. Segundo ela, a família foi chamada algumas vezes pela polícia “para mostrar que estão trabalhando”.
O contato se dá principalmente por ligações do chefe do órgão, Rivaldo Barbosa de Araújo Júnior. No entanto, eles não têm acesso a detalhes das investigações. “Sinceramente, em alguns momentos parece que tem alguém muito grande [envolvido no crime] ou que eles [policiais] estão perdidos. Não tem um meio termo”, afirmou Anielle.
Os parentes mais próximos de Marielle - seus pais, Anielle, e Luyara, filha da vereadora - não acreditam que possam ser alvo de atos de violência. Ainda assim a família desacelerou a rotina, dentro do possível, por precaução. Desde a morte, passaram por “situações esquisitas”.
Um homem abordou Anielle na rua e disse para ela tomar cuidado com quem falava. Além disso, em pelo menos duas ocasiões, carros desconhecidos estacionaram na porta da casa onde a família mora, na zona norte do Rio. A polícia não ofereceu serviços de segurança aos parentes.
A viúva de Anderson Gomes, a servidora pública Agatha Reis, também disse estar preocupada. Ela está sem contato com a polícia desde o mês passado e não chegou a falar diretamente com os investigadores. Tratou somente com as atendentes da delegacia.
Ela diz que o sigilo “é uma faca de dois gumes” e que com frequência questiona se ele é de fato útil. Como Anielle, ela se informa dos desdobramentos do caso pela imprensa do Rio. “Minha rotina de manhã é procurar alguma coisa que saiu na internet”, afirmou.
Agatha conta já ter ouvido mais de uma vez que a morte do marido já estaria “resolvida”, uma vez que a única motivação do seu assassinato seria “estar no lugar errado, na hora errada”, em contraste com a de Marielle, que ainda está em aberto.
Ela também classificou como “ofensivo” não ter sido convidada a duas mobilizações, organizadas pela ONG Anistia Internacional, para exigir justiça.
Mídia
Os desdobramentos recentes da investigação têm vindo a público principalmente pela imprensa carioca, especialmente pelo jornal O Globo, que teve acesso a depoimentos de testemunhas do caso.
Segundo o jornal, o principal interessado na morte de Marielle seria o miliciano Orlando de Curicica, preso desde outubro do ano passado por porte ilegal de arma.
Ele estaria incomodado com a atuação da vereadora em “questões fundiárias” numa região dominada por sua milícia, na Zona Oeste da cidade. Conforme CartaCapital apurou, no entanto, a atuação de Marielle na região se resumiu a três eventos pontuais durante o seu mandato.
Orlando teria mandado Ruy Ribeiro Bastos, seu subordinado, matar Carlos Alexandre Pereira Maia. Conhecido como Alexandre Cabeça, ele trabalhava como assessor informal do vereador Marcello Siciliano (PHS) - cuja base eleitoral, por sua vez, também se concentra na Zona Oeste carioca. Segundo o depoimento da testemunha, a morte de Cabeça foi uma queima de arquivo ligada à execução de Marielle.
“O feeling do jornalista investigativo voltou com o caso da Marielle”, comentou Renata Souza, chefe de gabinete da vereadora. “Soltaram tudo no início, e isso prejudicou a segurança da investigação. Então deram uma silenciada total.”
Como a família, ela também diz “não ter ideia do que está acontecendo” na investigação. “Quem tinha que ser ouvido já foi ouvido. Não dá para que uma cortina de fumaça se apresente como solução do caso.”
Contatada por telefone, a Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro ressaltou sua política de sigilo, indicou que as investigações seguem e negou entrevista com os delegados que atuam no caso.
Por Laura Castanho, na Carta Capital
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