Movimentos de direita falam em pedofilia. Juiz e desembargador veem 'histeria'. Museu diz que sinalizou sobre nudez em sala e que trabalho não tem conteúdo erótico.
Vídeo com criança durante performance no MAM, em SP, sofre críticas nas redes sociais
A performance de um artista nu no Museu de Arte Moderna (MAM), no
Ibirapuera, Zona Sul de São Paulo, gerou polêmica nas redes sociais. Um
vídeo que viralizou no Facebook mostra quando uma criança de
aproximadamente quatro anos toca no pé do homem. O Movimento Brasil
Livre (MBL) e outros movimentos de direita falam em crime; desembargador
vê "histeria".
A apresentação do artista Wagner Schwartz ocorreu somente na
terça-feira (26), na estreia do 35º Panorama de arte Brasileira,
tradicional exposição bienal que aborda a arte no país e propõe reflexão
sobre a identidade brasileira. Segundo o MAM, o evento era aberto a
visitantes que estivessem no local. O museu também informou que havia
sinalização sobre a nudez na sala onde a performance ocorria
.
Artista foi atacado
nas redes sociais por permitir interação de criança quando estava nu em
performance no Mudeu de Arte Moderna (MAM), na Zona Sul de SP (Foto:
Divulgação)
A performance chamada “La Bête” foi inspirada em um trabalho de Lygia
Clark. “Bichos” é considerada a obra viva da artista, pois sua intenção
era de que a arte ultrapassasse os limites da superfície de um quadro. A
série de esculturas com dobradiças permite que o espectador se torne
figura atuante na obra, e foram construídas com formas geométricas para
que não se parecessem animais, mas que permitissem uma visão livre do
que a peça representava.
Em “La Bête”, o premiado artista Schwartz, que trabalha há quase 20
anos com coreografia, manipula uma réplica de plástico de uma das
esculturas da série e se coloca nu, vulnerável e entregue à performance
artística, convidando o público a fazer o mesmo com ele.
De acordo com o MAM, o público presente na performance era formado
essencialmente por artistas e, uma das pessoas que prestigiou a
apresentação foi a performer e coreógrafa Elisabeth Finger acompanhada
da filha. O vídeo que viralizou nas redes sociais mostra o momento em
que Schwartz está deitado, e mãe e filha, tocam seus pés.
Reação
O MBL divulgou um vídeo nas redes sociais em que chama a apresentação
de “repugnante”, “inaceitável”, “erotização infantil”, “afronta”,
“crime”, e afirma que a criança “se sentiu constrangida”. O grupo
acrescenta que o vereador Fernando Holiday (DEM) vai “tomar as
providências sobre o caso da criança induzida a ato libidinoso”.
O deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ) chamou os envolvidos de "canalhas" e
categorizou a atividade como "pedofilia". O deputado Marco Feliciano
(PSC-SP) considerou as cenas "revoltantes" e os envolvidos "destruidores
da família".
Em nota (veja a íntegra ao final da reportagem),
o MAM informou que a sala estava "devidamente sinalizada sobre o teor
da apresentação, incluindo a nudez artística". O museu também afirmou
que “o trabalho não tem conteúdo erótico e trata-se de uma leitura
interpretativa da obra Bicho, de Lygia Clark”.
"Importante ressaltar que o material apresentado nas plataformas
digitais não apresenta este contexto e não informa que a criança que
aparece no vídeo estava acompanhada e supervisionada por sua mãe", diz a
nota.
Movimento Brasil Livre
(MBL) reage intensamente nas redes sociais contra performance realizada
no Museu de Arte Moderna (MAM) (Foto: Reprodução/Facebook)
Deputado Jair Bolsonaro também reagiu contra a apresentação no museu (Foto: Reprodução/Facebook)
Deputado Marco Feliciano também reagiu contra a apresentação no museu (Foto: Reprodução/Facebook)
Aspecto jurídico
O G1
consultou o juiz Jaime Medeiros da vara da Infância e da Juventude
sobre o caso. “É importante deixar claro que não acompanhei o caso, mas
pelo que vi por meio da imprensa, seria adequado se houvesse restrição
de idade à apresentação por conta do conteúdo. Sou um defensor da
liberdade artística e de expressão, mas vejo que foi a falta de cautela
que gerou a polêmica”, opinou o juiz.
“Sobre tipificar a conduta do artista como crime, não me parece
adequado. Não sei como o MAM procedeu, mas vejo uma falha por não terem
aumentado a idade de acesso permitida. Essas questões de exibição são
sempre delicadas porque você não pode censurar de maneira nenhuma, mas a
criança tem que ser protegida integralmente”, continua o magistrado.
O desembargador Antônio Carlos Malheiros, do Tribunal de Justiça, compartilhou com o G1
uma opinião similar àquela do juiz. Ele disse que o Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA) orienta os espaços a indicarem restrição de
idade sobre o conteúdo exibido.
“Chamar qualquer episódio mais insinuante de ‘pedofilia’ virou uma
histeria coletiva. Isso precisa ser afastado. Agora, de fato, a criança
não poderia estar presente. Não considero pedofilia, mas é uma ação
absolutamente inconveniente para uma criança. Ou seja, esse artista e a
própria mãe da criança que estava com ela podem ser advertidos. Mas não
vamos chegar ao exagero de achar que era um comando pedófilo”, explica o
desembargador.
“O ECA tem medidas protetivas às crianças, que não permitem que as
crianças estejam em determinados locais onde determinadas cenas podem
eventualmente chocá-las. E a cena pode, sim, vir a chocar uma criança.
Nesse aspecto foi absolutamente inadequado”, continua.
“Não sei qual foi o procedimento do MAM, mas ele deveria estar ciente
de que haveria cena de nudez com manipulação e restringir o acesso do
público. Em caso de dúvida sobre restrição de idade, ele poderia acionar
a vara da Infância e da Juventude, pedindo uma orientação”, completa o
desembargador Antônio Malheiros.
Veja a íntegra da nota do MAM:
O
Museu Arte de Moderna de São Paulo informa que a performance 'La Bête',
que está sendo questionada em páginas no Facebook, foi realizada na
abertura da Mostra Panorama da Arte Brasileira, em apresentação única.
A
sala estava devidamente sinalizada sobre o teor da apresentação,
incluindo a nudez artística, seguindo o procedimento regularmente
adotado pela instituição de informar os visitantes quanto a temas
sensíveis.
O
trabalho apresentado na ocasião não tem conteúdo erótico e trata-se de
uma leitura interpretativa da obra Bicho, de Lygia Clark, historicamente
reconhecida pelas suas proposições artísticas interativas.
Importante
ressaltar que o material apresentado nas plataformas digitais não
apresenta este contexto e não informa que a criança que aparece no vídeo
estava acompanhada e supervisionada por sua mãe. As referências à
inadequação da situação são resultado de desinformação, deturpação do
contexto e do significado da obra.
O
MAM reafirma que dedica especial atenção à orientação do público quanto
ao teor de suas iniciativas, apontando com clareza eventuais temas
sensíveis em exposição.
O
Museu lamenta as interpretações açodadas e manifestações de ódio e de
intimidação à liberdade de expressão que rapidamente se espalharam pelas
redes sociais.
A
instituição acredita no diálogo e no debate plural como modo de
convivência no ambiente democrático, desde que pautados pela
racionalidade e a correta compreensão dos fatos.
Fonte: https://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/interacao-de-crianca-com-artista-nu-em-museu-de-sp-gera-polemica.ghtml
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